sexta-feira, maio 23, 2008
Amnistia Internacional
quinta-feira, maio 22, 2008
25 de Abril de 1974
Nos meus tempos de escola - não foi há tanto tempo assim - os manuais escolares não abordavam muito profundamente o tema do 25 de Abril. O que fui aprendendo foi essencialmente pelo que os professores e a minha família contavam. Infelizmente, actualmente, o conhecimento dos jovens sobre a Revolução de Abril continua deficitário. Essa foi aliás, e muito bem, uma preocupação expressa pelo Presidente da República aquando das comemorações este ano. Considerando todos estes aspectos pensei este ano em retomar uma metodologia que já tinha experimentando há dois anos... Haverá maneira melhor de aprender do que falar com as pessoas próximas de nós (família, vizinhos, amigos) que tivessem vivido nessa altura? Na minha opinião, os objectivos de aprendizagem foram cumpridos com sucesso e as entrevistas por vós realizadas são autênticos documentos históricos e que por essa razão deverão ser partilhados. Assim, e como vos prometi, colocarei neste blogue alguns excertos das vossas entrevistas para que desta forma, partilhando, possamos todos nós contribuir para manter viva a nossa História ainda tão presente...
Por várias razões que se relacionam com a privacidade e protecção dos entrevistados, as respostas vão apresentar-se anónimas.
Continuo, entretanto, à espera que todos me enviem as entrevistas...
Já enviei para todos um convite para se tornarem editores directos do blogue. Espero que continuem a mantê-lo activo e que este seja um ponto de ligação entre todos nós.
Um abraço grande e muitas saudades da vossa formadora que vos adora e que tem muitas saudades,
Ana Neves
Censura
"Havia um controlo intenso sobre aquilo que os meios de comunicação social divulgavam, quer a televisão a rádio ou os jornais. O Estado criou um órgão próprio para definir aquilo que podia ou não ser divulgado. Em tudo quanto merecesse a desaprovação daquele órgão era aposto um carimbo “CENSURADO”, daí que aquele serviço fosse chamado “A Censura”.
Entrevista realizada por Diana Silvano. Idade do Entrevistado em 1974: 16 anos
"A PIDE fazia a censura, controlava os movimentos de todos aqueles que ousassem ofender de qualquer maneira o governo, estavam presentes nos poços fronteiriços. Depois por exemplo, todos aqueles que o governo conseguia prender por serem opositores a este, torturavam-nos tirando à força informações para também poder descobrir outros".
"Não era comunista e esses é que eram atacados. Quem era politicamente comunista é que queria implantar o comunismo, como recebiam dinheiro da Rússia. A gente não sabia o que eram partidos, nem rádio tínhamos. Só sabíamos que havia o Salazar e os maus que eram os comunistas. E a BBC que era à meia-noite, quem tinha rádio apanhava. A Rússia e esses é que ouviam. Só as tabernas é que tinham rádio (...) A gente lia o que estava nos jornais, que passava. As zaragatas não saiam para os outros não fazerem mais tarde. Quando havia TV ( na altura estava em Lisboa), as noticias eram de festas, não havia notícias agrestes, mas nós nem nos apercebíamos (...) Quanto aos filmes de TV não davam tudo o que queríamos, eles aos beijos faziam uma simulação mas não se via, nos é que tínhamos de imaginar porque eram cortadas, nas notícias davam das aldeias, violência não havia".
Entrevista realizada por Martinho Ferreira. Idade da Entrevistada em 1974: 32 anos
"[Liberdade de expressão] não havia, e era preciso muito cuidado em falar em assuntos políticos, porque havia uma polícia secreta que tentava ouvir as conversas às escondidas. E quando éramos escutados por essa polícia, tínhamos que ter a responsabilidade do que dizíamos, caso contrario éramos presos. O Governo não permitia que falássemos mal de assuntos políticos porque se vivia numa ditadura (...) Naquele tempo só havia um canal, que era a RTP, que era controlada pelo estado novo e também havia só uma rádio que era a rádio clube português, que também era controlada pelo estado. [Nas artes] tudo o que quisessem não podiam fazer, mas iam dizendo e encenando as peças com alguma ironia e iam dizendo algumas verdades ao governo. Porque se o fizessem eram presos ou emigravam para outros países.A Guerra Colonial
"O Ultramar, compreende os territórios que, embora não integrados no Continente Europeu, ainda ali a soberania do Estado Português se manifestava. Em 1974 o Ultramar integrava os territórios que hoje correspondem aos Estados da Guiné-Bissau, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Angola, Moçambique, Timor-Leste.
Entrevista realizada por Diana Silvano. Idade do Entrevistado em 1974: 16 anos
"Esta guerra, deveu-se fundamentalmente aos interesses económicos instalados em Portugal e em colónias portuguesas que tentaram reprimir de tal forma os povos das ex colónias, para prevalecer os seus interesses. Os povos dessas colónias começaram a sentir a necessidade de se organizarem para ofereceram resistência ao regime, de tal forma que tiveram que passar para uma luta armada (...) A dada altura com a luta armada a crescer, alastrando praticamente a todos os territórios com tal intensidade, que a certa altura a palavra de ordem do regime era de “para a África e em força” (...) a polícia política estava infiltrada em ambos os sítios, inclusivamente nas próprias colónias, para além de infiltrados brancos, haviam também africanos infiltrados nas forças armadas".
Entrevista realizada por Joana Bonito. Idade do Entrevistado em 1974: 22 anos
"Os rapazes foram todos para a guerra. Muitos ficaram lá. A América e Inglaterra não viam com bons olhos (...) e Portugal era uma nação pequena mas tinha muitas colónias como Moçambique, Angola, Cabo Verde, Guiné, São Tomé e Príncipe e meteram tropas em Angola como tinha muitos bens, ouros e diamante. [Os EUA tinham interesses nas colónias] e a Rússia queria meter o comunismo para fazer explorações. No fim de Portugal sair eles lutavam para ficar com os negócios e riquezas. Em Angola lutavam e meteram as tropas “cubanas” e roubaram tudo até as campas dos cemitérios e as nossas tropas voltaram para Portugal (...) Havia muita pobreza para os nossos governantes sustentarem a guerra. Quando se deu a guerra o teu avô tinha uns 23 anos e começaram a chamar quem estava a fazer tropa. Depois começaram a chamar outros que já tinham feito e uma altura o avô tinha 25 anos e só os que tinham 24 é que foram. Quem tinha filhos e era casado ou quem eram o sustento da família não ia. Só em caso de grande violência é que chamavam quem estava na reserva. O teu avô se fosse já tinha deixado geração, queria deixar fruto. (risos)"Entrevista realizada por Matinho Ferreira. Idade da Entrevistada em 1974: 32 anos
O Namoro e o Casamento antes da Revolução de 1974
"Era uma sociedade muito mais atrasada, muito mais reprimida. Os namorados faziam muito mais coisas às escondidas (risos) (...) Principalmente em relação ao divórcio, existiam muitas diferenças. As pessoas eram mais reprimidas, a sociedade criticava aquelas que se separavam, era tudo muito mais controlado. Se uma mulher se queria separar do marido era bastante criticada, enquanto que hoje em dia já não, as mulheres têm muito mais liberdade e direitos perante a sociedade".
Entrevista realizada por Joana Carpelho. Idade do Entrevistado em 1974: 17 anos
"Os beijos antigamente eram às escondidas porque os namorados tinham medo dos pais, e os pais não consentiam. Havia vergonha da parte dos namorados. Havia respeito."
"Era a um Quilometro de distância (risos). Era a janela e nos bailes, ao domingo e quarta-feira. Não é como hoje. Era uma lei e todos sabiam. Mas para namorar tinham de pedir aos pais. Os que não eram permitidos, os pais batiam (...) A avó era pobre e os pais do avô não deixavam porque eram ricos e queriam uma mulher rica. Os pais dele não foram ao casamento e até nos queriam matar. Na terra uma rapariga que andava com um rapaz, se ele a deixasse era raro ela casar, com medo que ela já tivesse sido beijada. Só quando estavam para casar é que se beijavam. Também faziam maroteiras como agora mas não se sabia. Um beijo na altura era uma desonra. Quando andavam na catequese já ensinavam que não se podia beijar. Agora depois da missa eles cumprimentam-se todos. Na altura “Ai Jesus!”
Entrevista realizada por Martinho. Idade da Entrevistada em 1974: 32 anos
"[O divórcio] Embora permitido, tinha um processo muito mais complicado porque a igreja exercia uma curta pressão sobre a sociedade e o governo político, porque se não vejamos o seguinte; a seguir ao 25 de Abril, o então ministro da justiça, Dr. Salgado Zenha, numa das suas deslocações a Roma, conseguiu obter da hierarquia da igreja uma alteração à concordata, o que permitiu flexibilidade ao novo regime jurídico português".
Relações Familiares antes da Revolução de 1974
"Era uma relação aberta e confortável. Não me recordo que houvesse assuntos assumidamente tabus".
"Era uma relação mais fechada que a de actualmente, não havia tanta liberdade. A própria sociedade civil não permitia porque havia um determinado tipo de depressão. Tinha que haver um certo respeito em relação ao que o poder definia".
Entrevista realizada por Joana Bonito. Idade do Entrevistado em 1974: 22 anos
"Era muito boa, Era sempre muito boa. Éramos obedientes, o que os pais diziam era uma escritura. O que os pais diziam estava certo porque sabíamos que os pais é que queriam o nosso bem, não os de fora. Eram pobres mas alegres e trabalhavam no campo (...) [dáva-me melhor] Com os tios. Eram pobres, cada qual desenrascava-se. Uma vez por ano o avô matava um porco e a família reunia-se. Na época do Natal, a fogueira ficava a arder desde o natal ao dia de Reis, era um dia festivo como o Natal ou Ano Novo.Entrevista realizada por Joana Carpelho. Idade do entrevistado em 1974: 17 anos